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Cg 125

Para nós motociclistas, 1976 merece ser lembrado como o ano do nosso grito de independência das importações de motocicletas. Foi nesse ano que a Honda lançou a sua primeira motocicleta "made in Brazil", a Honda CG 125 “bolinha”, sucesso instantâneo de vendas, provavelmente por ser a única opção de motocicleta de 125 cc à venda no país. Antecipando-se à proibição de importações de motocicletas imposta pelo Decreto-lei nº 1.455, de sete de abril de 1976, Yamaha e Honda decidiram fabricar motocicletas no Brasil.


A primeira a instalar-se no Brasil foi a Yamaha, no ano de 1974, na cidade de Guarulhos-SP, tendo como seu primeiro produto nacional a RD 50. Incentivada pela iniciativa da Yamaha, a Honda também decidiu aportar em terras brasileiras, em 1976, beneficiando-se de incentivos fiscais oferecidos às empresas que instalassem fábricas na Zona Franca de Manaus, iniciando a fabricação da CG 125.


Apesar de a Yamaha ter sido a pioneira, talvez por não contar com os mesmos incentivos fiscais que a Honda tinha por estar em Manaus, lançou seu produto de forma acanhada, como se não acreditasse no imenso mercado que teria caso fosse mais agressiva e oferecesse produtos mais compatíveis com o anseio dos consumidores (somente em 1978 a Yamaha acordou e lançou a RX 125, mas era tarde demais, pois a Honda já tinha dominado o mercado.


A Honda, por sua vez teve a visão do potencial do seu produto e partiu logo para oferecer uma moto de 125 cc, que preenchesse o vazio deixado pelas importadas. O resultado não poderia ser outro além de encontrar um mercado sem concorrência e com espaço para toda a sua capacidade de produção.


Ao invés de copiar o modelo CB 125 importado até então, a Honda decidiu criar um produto novo, mais adequado à realidade financeira do brasileiro, oferecendo acertadamente um produto que coubesse no nosso bolso. Lembro que na ocasião do seu lançamento houve alvoroço e muita festa, contavam-se os dias para que pudéssemos ver na vitrine a esperada 125 nacional. Até o Rei Pelé foi chamado para ser o garoto-propaganda da Honda.

Finalmente ela chegou e uma unidade foi exposta numa das vitrines de uma concessionária da minha cidade, onde todos pudessem conhecer a novidade. A procura foi tão grande que qualquer candidato a adquirir o novo modelo tinha que entrar em longas filas de espera e sujeitar-se ao ágio que concessionárias inescrupulosas passaram a cobrar dos mais apressados. Mas nada disso impediu o estrondoso sucesso da nova moto.


Já no ano seguinte ao seu lançamento a CG 125 era a líder, responsável por 80% das vendas de motocicletas no Brasil, posição de liderança que ocupa até os dias de hoje, 34 anos depois. Não posso dizer que o modelo tupiniquim era uma musa em termos de beleza pois a importada era mais bonita, melhor acabada e ainda oferecia uma gama de cores bem mais generosa, mas como aquela era a nossa única opção de motocicleta de 125 cc, teríamos que nos acostumar na marra ao design meio estranho se comparado aos padrões das importadas. As primeiras que chegaram só eram oferecidas na cor laranja, somente mais tarde começou a vir também da cor azul.


Além do design modesto e o acabamento espartano, a nova CG 125 trouxe duas novidade diferentes do que conhecíamos até então: A primeira foi o câmbio de quatro marchas derivado da Honda Dream, quatro marchas todas para baixo, sem ser rotativo, ou seja, o retorno ao ponto-morto era feito escalando-se as marchas em sentido inverso (para cima). Para facilitar a redução das marchas a Honda instalou uma alavanca de câmbio equipada com extensão para acionamento pelo calcanhar; avançavam-se as marchas com a ponta do pé e retornava-se com o calcanhar. Só em 1983 é que a CG 125 ganhou o câmbio de 5 marchas.


Nas primeiras saídas com a CG 125 não se podia cambiar instintivamente porque era comum engatar a primeira no sinal, esticar a marcha e no momento de passar para a segunda, puxar o pedal para cima onde era o neutro, esgoelando o motor numa aceleração vazia, o que provocava baita vergonha pela barbeiragem.


A segunda mudança foi no posicionamento da chave de ignição que ao invés de estar no painel, foi deslocado para sob o tanque de combustível, no lado esquerdo, próximo às bengalas e trava de guidão. Era necessário deitar o corpo para o lado para poder visualizar o local de inserção da chave.

A moto era muito boa, robusta, seus componentes eram feitos de material resistente, principalmente o motor que nunca quebrava, mesmo quando exigido além das suas especificações.


Aos poucos a nova moto foi ganhando o respeito e confiança de seus proprietários, transformando-se no “fusca de duas rodas”, atendendo todo tipo de uso desde o lazer, locomoção, como também para o trabalho; foi imediatamente adotada pelos motociclistas que trabalhavam com moto-frete devido à sua economia de combustível e baixo custo de reposição de peças e manutenção.


Com seu motor monocilíndrico de 4 tempos, refrigerado a ar, que oferecia 11 cv a 9.000 RPM, chegava a aproximados 100 km/h de velocidade final e era o tipo de moto que preenchia as necessidades daquele momento da história quando os combustíveis eram caros e havia pouco dinheiro no bolso dos brasileiros. Essa receita de sucesso sofreu uma série de mudanças nesses anos desde o seu lançamento, mas não perdeu a sua personalidade e imagem de moto valente, econômica e confiável para enfrentar qualquer desafio.


Mesmo nos dias de hoje é a moto de 125 cc preferida dos brasileiros de todos os cantos, proporcionando profundas mudanças culturais ao invadir o campo como importante meio de trabalho e transporte – talvez o maior exemplo de impacto cultural podemos observar no nordeste do país, onde o jegue, tradição de transporte do nordestino desde a época do descobrimento do Brasil, foi irreversivelmente substituído pela motocicleta.


Difícil estimar a importância da CG 125 no desenvolvimento econômico do nosso país, mas podemos afirmar com muita segurança que seu papel foi relevante e merece destaque histórico. Foi ela também que abriu as portas a novos modelos e cilindradas que rechearam nosso mercado de opções aos amantes do motociclismo, motivando Suzuki e Yamaha a desejar uma fatia maior do filão que é o mercado de motocicletas em nosso país, que passaram junto com a Honda a fabricar aqui, motos de cilindrada cada vez maiores, atendendo aos mais variados gostos e usos.


Só temos a agradecer à Honda pela sua visão e coragem quando decidiu montar uma das suas fábricas em nosso território, viabilizando o desenvolvimento de empresas fornecedoras de moto-peça, aprimorando a qualidade da nossa mão-de-obra e gerando riquezas que passaram a ficar aqui, ao invés de serem remetidas para o exterior.


A robustez e aceitação da CG 125 motivou a Honda a se aventurar em algumas derivações dela criando uma versão com motor a etanol, em fevereiro de 1981, fabricada somente neste ano – interessante que essa versão vinha com o câmbio tradicional de 5 marchas - e uma versão Cargo (1988) com apenas um banco largo e um enorme bagageiro. Mas esses assuntos vamos deixar para abordar em uma nova oportunidade.

 

Autor: Mário Sérgio »

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